domingo, 14 de dezembro de 2008

24 de dezembro

Victor Rocha Nascimento





"Desde o início era ele e só ele. Não tinha família, nem pais nem nome. Alguns de maior convívio, freqüentadores daquelas mesmas ruas, o chamavam de zé. zé, que zé? Não era zé de Jozé, loge desta fineza. zé era de zéninguem, de zé-das-couves, zé de fulano, de zezinho como o tal do joão. Ele era zé e ponto.
Acordava com o bocejo da matina e procurar trocados, trabalho, comida... Se nao um, era outro, mas era sempre procurar e só. Raras vezes o zé encontrava migalhas de restos do que sabia pedir e caçar.
A vida sempre foi dura com ele, e quando a vida sisma de ser dura ela dura mais que outras vidas e acabar por malícia do ofício endurecendo o coração. Mas ele não ligava, só sentia e nao reclamava. (...) Por agora, aquela vida era o único jeito que tinha. Ele se confortava dos sussurros pesados e inconvenientes de sua mente e ainda empolgado exclamava para o mundo que 'antes vivo nessa vida do que morto em outra qualquer'. Essa era a rotina-sub-vida daquele molequinho alí da rua, que passa todo dia, enchendo pedindo, calando, correndo. A rotina do zé, do zézinho, zé-ninguem."

Trecho de "24 de dezembro" de
Victor Rocha Nascimento