terça-feira, 29 de setembro de 2009

Devaneios loucos, fruto da rotina

Victor Rocha Nascimento

Viajar na madrugada é sempre assim. Você, suas idéias e suas lembranças. O frio. As sombras e as trombadas. Desconhecidos babam e roncam à sua volta compondo um cenário caricato(ora, se não é esse o papel dos desconhecidos). Um show de paisagens pela janela. E sempre, sempre só. Acho que é um momento propício para criar.

É minha rotina de viagens. Se não leio, escrevo, escrevo, escrevo e parece sempre ter uma ultima gota de idéia pra respingar no papel. O único obstáculo são estes diachos desses tremeliques que me fazem riscar e amassar a folha inteira. Como se já não bastassem os meus garranchos costumeiros. (por isso peguei o lap)

Um ronca, outro não se inquieta e procura loucamente um jeito de se acomodar, outro se delicia no ópio dos fones de ouvido no ultimo volume... E todos eles se quer existem, de fato, para mim...

Quantas vidas. Quantas idéias não devem nascer de um instante escuro, numa viagem pela madrugada? Quantas rotinas, quantos sentimentos apertados entre braços de poltronas pouco confortáveis. Quanto barulho e quanto silencio. Quantas contradições. Cara... Hora estranha para poder morrer.

Não, pensando bem, talvez não houvesse hora melhor.

Sonhos, pensamentos e sentimentos presos num ônibus, apertados e se misturando por falta de espaço... Tanta fertilidade e de repente puft. Acabou.

E agora? O que vem? Nada de muito diferente. Ainda estou num plano de idéias. Estou refletindo e nada mais existe se não eu comigo mesmo. Não sinto, nem escuto, mesmo que haja muito barulho.

Só algumas sombras, uns tremeliques e eu. Minhas reflexões. Talvez uma viagem solitária seja mesmo o mais próximo que podemos chegar da morte. Existimos só em nós mesmos. Somos completos e rendemos mais.

Talvez seja a hora em que mais estejamos preparados.

Como acontece pouco importa. Importa é que a passagem é menos sofrida. Somos a plenitude de nós mesmos e o resto é só senário. Somos alma e as matérias são insignificantes. Somos idéias e o mundo fica cada vez mais distante da imensidão do nosso mais entranhável.

Engraçado pensar na morte, e pensar, e viver. Talvez nunca me sinta tão vivo. Talvez só quando com uma garota ou jogando vôlei, mas talvez não. Talvez nunca me sinta tão vivo quando quando penso sobre a morte e, de fato, um dos meus momentos mais lúcidos se dá quando penso, e penso, e penso e sou todo eu. Sou mais real quando vivo nos sonhos.

Rá. Muito divertido o que pode-se fazer quando se está só. Essa rotina de ônibus e estrada me faz não poder mais parar de viajar. Melhor dormir...

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O devorador de pecados

Victor Rocha Nascimento

Sempre tem que ter alguém para tomar as dores. Para se sacrificar. Para resolver. Alguém que ajude e pague o preço de milhares. O mundo é feito de martiris e a evolução foi escalada por sobre suas costas.
Algumas vezes, até mesmo eles carecem de desabafos...

'Que coisa mais bizarra é essa de poder entender os sentimentos. Poder mastigar e engolir. Saborear as agonias e orgasmos no sumo. Me corromper da culpa e da resposta do mundo.
Se não entendo os motivos que formam os homens, certamente entendo seu interior. Compartilho tão bem que o faço renascer dentro de mim e me torno xifópago de seus sentidos.
Não apenas devoro pecados, como também sonhos, amores e reações. Me lambuzo ao livrá-los de tudo isso e martirizo minha própria força.
Acho que tudo não passa de um teste, uma preparação. Me confundo no choque de minha humanidade e meu dom. Peco ferozmente quando penso sobre mim mesmo. Não tenho escolha e nem futuro. Apenas o agora importa e me movo com objetivos imediatos e inesperados.
Meus sonhos me afetam mais que a realidade e de fato minha realidade não vale mais do que um sonho. Sou peregrino em caminhos escuros que entortam motivos e limpam vidas.
Me desculpem se, por hora, falo apenas de mim. Garanto que por mais ridículo que possa parecer, não sou eu o culpado.
Faço parte de uma corrente. Um trabalho complicado e destrutivo. Talvez por isso eu não possa coseguir levar ninguém comigo. Todas as tentativas foram frustradas e pareço ter de me desvencilhar do que vinha pronto. Não posso ser para um se não para todos.
Mas sei bem que as impossibilidades nascem apenas em virtude de um bom motivo. Não tenho que reclamar. Nasci para isso e se não me contentar, me converto em um toco de madeira.
As verdades me afetam tanto quando a vocês, a diferença é que as vejo mais claras, mais completas.
Sem susto! Posso ser apenas mais um louco que se mete a falar. Penso em devaneios ter visto coisas demais. Talvez coisas que não existam em seu mundo. Coisas que ainda não tenham acontecido ou que nem possam acontecer. Mas certamente vejo coisas que você não vê, nem acredita, mas sente claramente.'

A vida é um pequeno rastro da verdade gloriosa e embriagante que nos envolve. Pare de respirar e tudo vai parecer mais límpido e assustador.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Lembranças de uma noite que não se vai

Victor Rocha Nascimento

Situaçãozinha desgraçada essa tal... Mesmo depois de tanto tempo, e de tanto aprender, tanto mudar, a gente acaba voltando pro mesmo lugar.
Tanta vontade, tanto choro e tanto grito para no final não fazer diferença. Naquela noite que a verdade me cuspiu na cara, me custava menos aceitar a vergonha dos fatos do que imaginar que seria só a primeira vez. Pior que era! E eu não notava, e continuo sem notar, que vai ser tudo sempre igual. Enquanto eu tento levar as coisas do meu jeito, vem o jeito das coisas e me humilha até me arrancar desistência.
Verdade maldita que só mostra meia face e me estapeia as duas com as mãos sujas em decepção!
Naquela noite parecia que, mesmo com a dor e com o sal me cortando o rosto, o principal havia sido dito e nada mais doeria tanto. Pobre tolo que eu fui, e tenho a mania escrota de ainda ser. Acontece que ou não aprendemos nada, ou esquecemos tudo, e voltamos aos mesmos erros. Fedemos a passado.
Talvez esteja na hora de tomar um choque brabo pra acordar. Talvez devesse mesmo mudar por completo, mas pode ser impossível chegar a conquistar tal fortuna. Quem sabe eu só esteja brincando comigo mesmo e não queira ou não precise mudar. Não seria tão improvável. O bicho homem é masoquista por natureza e viciado em se ferrar. Deve ser por isso que, por mais que a gente tome na cara, viramos a outra para que venha a a maldita da verdade dar mais, e mais, e mais...
Tudo tão simples, tão fácil e tão impossível.
A noite era fria e me faltava muito o ar. Só tinha força para sentir o desprezo do resto e o gelo do chão que me castigava. Não suportava o peso da verdade me esmagando e o mundo inteiro fugindo da vista.
Por fim, não restou a pena nem a mão que eu esperava. Me restou mais uma vez a danada da verdade, me fazendo um pacto de sangue, me obrigando a ser forte e a ser eu, aguentar a merdalhada toda. Em troca, a adaptação e felicidade. Pacto desgraçado que até hoje não vi se cumprir. Fiz minha parte e ainda espero que a verdade seja justa algum dia.
Noite tão fria que desconfio que tremia era por medo. Foi nessa noite que aprendi a ser forte, que aprendi não chorar.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Ratione materiae

Victor Rocha Nascimento

Falam sobre como gira a terra. Como giram os planetas, estrelas e luas. Como gravitam e imprimem forças tremendas criando harmonia perfeita em todo o universo.
Pois vos digo que quem gira sou eu, que nem gravidade sinto ou tenho, vivo a flutuar em minha totalidade imperfeita e confusa, mas incrível e eterna.
Giramos todos e somente nós. Pouco importa como, mas giramos e fazemos com que todo o resto queira nos acompanhar por prazer e necessidade. Carecem do sentido e função que apenas nós podemos dar.
E o centro do mundo nada mais é que um pontinho bêbado e tinhoso, que não consegue achar um lugar para se inquietar e nem casa própria tem. Vive rodopiando por aí, sem rumo, e ai de quem quiser seguir seu rítmo ou girar por seu entorno. Tentamos sempre mandar nas coordenadas do tal pontinho, mas só a loucura de sua própria bebedeira dita onde ele realmente vai ficar.
Mundo maravilhoso esse. Todo exatista, todo certinho, perfeito para nós.
Mundo feito dos numeros, do sumo da exatidão e por isso perfeito em sua beleza . Mas no fim, pouco importa a perfeição das contas. O que deveras conta é a matemática dos amantes e cabe aos poetas, e não aos matemáticos, o dever de tudo contar.
É na alma que se escondem os mistérios e é a imaginação que os faz importantes.
Não somos nada sem nós mesmos e nem o mundo importa algo. Somos patronos de nossos mundos e controlamos tudo que nos envolve, resta apenas podermos nos controlar.
De fato, sou eu quem gira e giramos todos nós.

o melhor de buscar uma peleja textual aos puramente exatístas é que eles vão se defender com números :P

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Poema dos mil amores

Victor Rocha Nascimento

Vem chegando a nova primavera
Justamente como o inverno pintou.
O óleo sobre a tela marcando o frio da ilusão metida a realidade.
E para você que pensou no mundo de um dia...
Resta a pena e o vício de velar sua ingenuidade.
Não há chance, nem há volta. Não é o real que me incomoda.
Me incomoda é o sonho que existe casado à esperança.
Escrevo não para um, mas para meus mil amores.
Cada um, de mim, leva uma parte. Cada um me angustia e precipita.
Cada um me acende e me perfura o pulmão.
Mesmo os que já foram, os que são e os que são sonhos.
E eu, deles, levo o infinito amor e desejo por suas virtudes, e o horror por seus erros.
Vivo porque as amo e vivem sem meu amor.
Mas o que me dói são as serifas das minhas próprias letras, que me rasgam, e não a falta da resposta.
Vivo dela, assim como vivo da dor e da esperança que tanto me incomodam.
De mim partem tantos amores, tantos motivos e tanto carinho.
Do mundo a repetição trágica do que jamais é visto.
Choro por mim e choro por elas, que são vítimas do meu desejo.
De instante, resta esperar que as mil se multipliquem e um dia virem uma.
De instante, não resta esperar nada.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

O Velho de Aparência

Victor Rocha Nascimento

Depois de tantos anos de birita incessante, o Velho de Aparência decidiu parar por um dia.
Não pense que foi fácil, mas também não foi tão complicado quanto parecia. Bastou um pouco mais de vontade e tratar o caso como desafio que deu certo.
O dia que seguiu foi desconcertante. Algo entre o medo das mudanças e a admiração pelo novo.
Ao acordar, sentiu a cabeça quilos mais leve. Levantou antes da hora, cheio de ideias e disposição. A casa parecia mais arrumada e a manhã parecia pedir licença para entrar pela janela.
Sua mulher, sempre chata, velha e ranzinza se transformara numa moça enxuta, bem mais delicada e de tom de voz suave. A mudança era absurda! Ela era completamente outra e encantava os olhos do Velho de Aparência como a antiga jamais poderia.
Já os seus filhos quase o colocaram em desespero no primeiro contato de sobriedade. Cada um deles parecia ter envelhecido uns sete anos. Todos responsáveis, inteligentes, estudados... Já haviam passado a pequena cultura do velho pai. E o tempo todo necessário para esta transformação tão grande? Simplesmente não existiu. Um mistério que o Velho de Aparência não conseguiu desvendar.
Parecia que até então ele habitava outro mundo ou então que esta realidade tão limpa era um sonho.
Foi um dia de descobertas. Se deparou com as marcas da sua própria destruição sem entender bem que era o culpado. Sentiu novos cheiros, admirou novas cores e relembrou sentimentos antigos.
A vida por outros olhos, outra fotografia. Um mundo mais sereno, que mesmo com toda a macheza do Velho de Aparência, cultivada e fincada com orgulho, fez ele se derreter como uma criança apaixonada.
Parecia que enxergava pela primeira vez. Estava bêbado de alegria. Amava tudo e todos que por ele passavam e se sentia cada vez mais coerente, cada vez mais humano. Ouvia melodias e se deliciava com o som. Recitava poesias até para as árvores. Foi feliz e tornou belo tudo o que olhava... Até que o dia passou.

Passou o dia... A semana... O mês... E o cheiro da pinga continuava a atormentar. Mas o Velho se embriagava era com a vida de sóbrio. Gostava do sentido das coisas e tinha se apaixonado pela sua família. Quanto menos ele bebia, melhor parecia sua mulher e mais tempo duravam os filhos para crescer.
Mas nem tudo ia bem.
Os problemas voltaram a aparecer. Tanto os antigos, quanto novos, quanto os que ele plantou com seu bafo de cana. O Velho, de início, se desesperou. Como primeira opção, encarou a garrafa de pinga como um antigo troféu, prestes a ser reconquistado. Mas, antes que o pior pudesse acontecer, ele ouviu um burburinho... Algo mais forte que qualquer vício... Eram as risadas de seus filhos, de longe, quase sumindo.
O velho entendeu que nenhum mundo está isento de problemas, a grande diferença é que, agora, ele se sentia forte o suficiente para resolvê-los.
Depois de Velho, ele voltou a parecer jovem e finalmente aprendeu a viver.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Além da sociedade, a identidade.

Victor Rocha Nascimento

De tanto traduzir-te em medo,
Perdi a confiança que restava sobre mim.
De tanto insistir no incerto,
A certeza já viciou em contornar minha porta.
E a sociedade que me domina e dita meus modos já é culpada apenas por um quinhão da identidade que me afirma.
Sou eu, são os meus e é o meio que me fez ser assim. Tão inseguro e tão forte na dor.
Como a força exaustiva dos meus pulmões no dilatar de um ar tão frio que chega a aludir ao sólido, eu me forço a entender, a vibrar, a ser mais um e, ainda assim, ser eu mesmo.
Minha raça, minha crença, minha nação e até meu sexo. Ahhh, meu sexo. Que me obriga a atuar e a me impor. Ahhh, se eu pudesse esperar pela atitude delas, meninas, no lugar de reunir todo tipo de força para arrancar uma declaração. Ahhh se a história fosse diferente e as regras fossem outras. Tudo pura questão de sorte, de ocasião.
Essa sociedade que nos forma, nos domina e nos completa. Essa gente que se prende e se vicia nos preceitos das modinhas. Essa gente tapada que só vê o que lhes mostram pronto e não se dão ao trabalho de procurar novas vistas por si. Tantas cores no mundo e lhes resta, não sei se por opção, ficar trancados no comodismo e no tempo. No preto e branco.
Mas talvez seja esse o mundo real e eu esteja passando de suas arestas, de metido que sou. Talvez o erro seja meu em não limitar ao mastigado. Ainda que não acredite muito nisso, o "talvez" deve ser sempre levado em conta.
Ô mundo danado para se minimizar para uns e se agigantar para outros. Vai que existem vários mundos, e por certo que existem. Um para cada mente. Ou melhor... Creio eu, que cada mente é um mundo e nenhuma outra forma de mundo existe se não a própria mente.
Sendo assim, que me deixem em paz com a minha mente e cuidem das suas próprias. Na parte que ainda me resta do meu próprio mundo, prefiro ser eu mesmo, ainda que para isso deva ficar só e passar das arestas das sociedades e das modinhas.