sábado, 19 de junho de 2010

Ilusionexistir. Era ela que não era. Eramos eu.

Victor Rocha Nascimento

Não é suportável o cheiro nem nojo do jeito que era. Assombrava fera.
Mas está tudo certo, tudo entendido e gravado em ponto cego, preciso.
Estou contente na certeza de que vim de outro mundo. Como dos restinhos, sem ter que acabar com meus princípios. Com minh'alma de guerreiro branco e minha cara de vagabundo.
Contei um passado de sonhos docês que me cortaram em física pura. Alimentei minhas dores com o receio de uma vida mais dura. Não sei se acerto, se sou certo, se é certo. Apenas sou limpo. Vivo em mim e nada sinto.
É bom percorrer o mundo em sorte, ver de perto a morte, sentir o gosto do sal e saber que tudo faz a gente ser mais. É bom perder, sofrer e saber que foi feito por um fim. É bom saber escolher e ter motivos. É maravilhoso poder me descobrir e te entender em mim.

Chegou a hora das grandes notas saltarem feito flechas. E que os temores nos pactos por horas renasçam e se tornem mais que simples medidas nas brechas.
Chegou o tempo do novo e do banal sustentado entre eras. É hora do velho voltar no tempo e do puro cair por terra. Já se fez o momento da idiotia se redimir.
É sobre alguém que sente mais do que pretende, e, descontente, mente e ressente as vontades com remendo. Tenta se limitar com o coração que o prende e acaba descrente do próprio sentimento.
Se droga de pobreza e se alimenta de solidão. Respira coitadices e se banha de fraquezas cômodas como se tivesse razão.
É sobre você.
Por que você é só por querer ser. Por que você mente para tentar se preencher.
Não faz sentido sustentar essa trama de gozos retidos num pedestal raso. Não faz sentido que se persista numa existência tão pequena e tão trancada em descaso. Se por isso, não vale sequer existir.
Tudo que somos e o que podemos ser. Todo o mundo, tudo que existe e o que vai além. Tudo deixa de importar perante você. Tudo é efêmero quando recostado na crença rasteira. Tudo perde quando se acomoda em ser alguém.
Quando não há vida, resta morte. Quando não há saída, resta a sorte. Quando estanca a ferida, fica o corte. Quando a mente está perdida, renova no choque. Quando tudo é despedida, melhor saber ser forte.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Do monte. Do todo. De si.

Victor Rocha Nascimento

Montes de saliva que escorrem pela boca. Mirava o frango sem respirar, mantendo ritmo nos pulsos, correndo o sangue em todo corpo.
Montes de sonhos que escorriam dos olhos. Mirava a moça sem respirar, mantendo ritmo nos pulsos, correndo lava em todo o corpo. Transbordava pelas orelhas.
Imigrante de nuvens de algodão. Caçador dos temidos monstros, das quimeras mal-humoradas com espetos nas patas. Rei do mundo que fundou. Caçador de milagres, de motivos. Imigrante de nuvens de escolhas. Rei de si. Rei de nada.
Curtia o sabor do jeito, do cheiro, da ilusão. Acompanhava de perto o contraste do imperfeito, escrevia contos por frustração.
Sonhava amar. Se forçava a sonhar.
Era por ela nele mesmo. Era por ele, indignado, em choro seco. Era temido por roer a lógica, deslumbrado por emoção. Todos cantavam sua glória, mas não havia quem pudesse suportar sua existência nem entender sua solidão.
O homem não passa de corpo empurrado pelo que se contesta. O homem é massa cravada em homem, regada em homem, moldada em homem e temperada de resto. É um tudo em que nada compete e que em nada se faz. Naturalmente perverso no mesmo.
Só mais um homem. Mais um perdido em meios, entre perdidos, entre questões. Apenas quer achar um lugar, um motivo. Apenas quer ser, ainda que não seja. Apenas quer e quer um motivo para querer.

Litros de sangue escorriam pelo peito. Mirava o futuro sem respirar, desregrando o ritmo dos pulsos, correndo marcas de tempo por todo o corpo.
Litros de sonhos escorriam pelo peito. Mirava a alma sem ter mais ar, sem sentir o ritmo dos pulsos, correndo em seu próprio corpo. Transbordava sobre todos os outros.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Instante em gelo

Victor Rocha Nascimento

Agora sinto o cheiro do gelo. Sinto como se fosse tudo e a medida se contorce atrevida. Agora não sinto as pontas dos dedos.
Agora lambo as feridas num vício de metal. Vendo meu passado e comemoro as dádivas. O que fui não volta mais. É o cheiro do frio, é o tempo, é o fim a curtos passos.
Choro, cuspi, respeito e contentamento. Uma semana depois, notei que durante uma semana só fazia olhar para ela. Um ano depois, notei que só havia importado uma semana, antes perdida.
É para que seja eu, e somente eu, que o mundo sofre assim. É por uma provação que eu mesmo cobrei.
Agora o frio queima, o tempo morre e eu... Eu espero poder ser enquanto tento achar limites pouco incômodos. Eu espero apenas ser enquanto desentendo, enquanto a mente falece, enquanto os olhos gangrenam.
Vivendo no limite entre o íntimo e o outro. Tentando ser dois, por necessidade e diversão. Sempre tentando, sempre distante, já que faz parte.
E aquela menina, Maria Louca, continua viva, recitando poemas e berrando aos surdos. É esse frio que controla o meio. Esse frio me faz natural, neural, neutro, coberto. Esse frio para o tempo e deixa a sala se arrumar.
Controla, controla, controla enquanto tenta se perder. Se alimenta de um mundo novo, criado de sonhos bobos, feitos para ajudar o tempo a correr.
Talvez o erro seja a melhor forma de me reencontrar com a humanidade. Quanto mais falho nisso, também acerto meus pés. Acho que estou indo bem.
Adoro os desafios da impossibilidade, até que me bate um sono e perco o saco, deixo o inevitável para depois.
Agora o frio queima, o frio prende, o tempo corre, o tempo morre e eu... Eu não.